segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Conflito


"Eu preciso de você" ela murmurou, com a cabeça enfiada no peito dele. O agarrava com força, apertando suas costas. Deliciava-se sentindo as mãos dele ao redor de seu pescoço. Mas talvez aquelas sensações todas não fossem sentíveis naquele momento. Porque ele estava partindo, e ela não queria que ele partisse. O apertou com mais força, tentando transmitir aquela ideia. "Por favor, não vá."
Ele a empurrou de leve, olhando para o rosto dela. Ele estava sério, ela estava chorosa. Ele odiava vê-la assim, ele odiava saber que causava isso nela - ele odiava saber todos os sentimentos que causava nela, até mesmo o amor, porque não considerava saudável se amarem assim. "Eu tenho que ir, você sabe. Mas eu volto próximo mês."
Próximo mês, ela repetiu mentalmente. Passou a língua pelos lábios brancos. Fechou os olhos, sentindo vertigem, sentindo dor de cabeça. Sentindo o que não queria sentir, sentindo o que precisava sentir. Como era possível sentir tudo aquilo? Sentir tantos calafrios, só de vê-lo com aqueles olhos sérios sobre si. Aquele poder tamanho sobre ela... Não era possível. "Vá embora, então." ela disse, com a voz embargada, tentando parecer mais cruel do que realmente conseguia. "Eu não me importo, sabia? Pode ir embora e nunca mais voltar. Nem próximo mês, nem próximo do próximo, nem nunca. Vai."
E ele não disse nada. Porque sabia que ela mentia, porque sabia que, se não voltasse, era capaz de ela enlouquecer. Ele não conseguia suportar aquele amor que ela nutria por ele. Ela estava tão dependente, era enlouquecedor. Ele não conseguia aguentar a pressão de nunca poder machucá-la. Mas não era essa a pior parte - ele a amava. Com toda a imperfeição dela, ele a amava. Ele a amava tanto que acordava no meio da noite, com o coração quase perfurando o peito, pensando nela. Mas não conseguia depender dela. Não conseguia depender de ninguém. "Você não quer que eu vá."
"Eu quero!" ela choramingou, tal qual uma criança birrenta. "Eu quero que você me deixe para sempre. Eu quero que você se agarre com um milhão de mulheres, eu quero que você transe com todas e eu ainda quero que você pegue AIDS, seu doente. Eu quero que você seja muito feliz com uma loira peituda e bunduda, com lábios finos e sorriso aristocrático. Eu quero estar na Igreja no dia do seu casamento, eu quero responder que tenho algo que impeça o casamento e eu vou dizer... eu vou dizer que você é um bundão e que ninguém merecia casar com você. Eu quero que você sofra, sempre, sempre, sempre. Eu quero que você saiba que eu te amo e que eu te amarei para sempre e quero que você sempre sinta culpa por isso. Eu quero que você vá para a China, catar arroz. Eu quero que você demore bem muito a morrer, para ficar bem velho e enrugado, eu quero que você..." ela começou a respirar fundo, vendo aqueles olhos sérios sobre si. Olhos céticos, de quem não acreditava em uma palavra. O corpo dela tremeu e ele a segurou. Ela tentou segurar as lágrimas nos olhos. "Eu quero que você..."
"Você não quer nada." ele disse. "Ou melhor, você me quer. E eu quero você. E é isso, e nós vamos ficar juntos para sempre. Ou melhor, você vai ficar comigo para sempre, porque quando eu morrer, você vai morrer. Mas quando você morrer, eu ainda seguirei em frente. Entendeu?"
Os olhos dela se arregalaram mais e mais. As lágrimas agora pingavam, incontáveis. O corpo tremia e queria ir ao chão - só não ia porque ele a segurava. Mas aquelas palavras... parecia que ele tinha escrito-as no seu cerébro. Tinha certeza de que nunca ia esquecer daquilo. Sabia que podia morrer naquele momento. Sabia disso. E tinha que acabar com aquilo naquela hora. Tinha que sair dali e nunca mais vê-lo. Mas não conseguia. Precisava dele como precisava de ar. Ofegou. "C-como..."
"Como eu me atrevo?" o sorriso dele era pequeno. "Atrevendo-me. Você nunca se atreve a nada. Você só consegue me amar. E eu te amo, nunca pense o contrário. Mas você... você depende de mim, não é mesmo? Eu não queria isso, eu queria que fosse igual. Porporcional. Mas não é minha culpa você ser tão... idiota." ele riu ao ver a cara chocada dela. Afagou-lhe os cabelos e a puxou novamente, abraçando-a com força. Ela tremia e tremeu ainda mais quando ele chegou a boca para seu ouvido. "E sabe do que mais? Eu estou indo embora agora... mas só fisicamente. Porque eu estarei sempre, sempre, sempre na sua cabeça. Sempre, entendeu? Você nunca vai conseguir se livrar de mim, meu amor, mas eu posso me livrar de você sempre que eu quiser..." mordeu o lóbulo da orelha dela, carinhosamente. "Até mês que vem."
Ele a soltou, ela caiu e ele se foi.

(e eis mais um conflito entre Ariel e Caliban - se bem que o Ariel é um cara também, mas já que eu ia trabalhar com pronomes...)

4 comentários:

Stefany Monteiro disse...

U-a-u. Minha nossa, ficou muito foda! E quando você descobre que é Ariel e Caliban TUDO faz sentido. A situação... o modo como ele falou... Caliban ♥. XDD

Ficou muito foda mesmo, Morg. Sério. Devia postar no FP.

Adorei. E esse post coloca muitas garotinhas que amam demais a pensar, sabia?

Hide and Seek disse...

E eis como seria se nós dois namorássemos. Eu quase ri na parte da China e do arroz, mas eu estava too much encantado pelo texto para isso XD

Adorei todos os posts que eu ainda não tinha lido =D Beijão ♥

João "Johnny" Roberto disse...

Tá, eu vi você totalmente na Ariel.
E, sim, depois, ao parar para pensar, imaginei ligeiramente o Lucas no Caliban, mas ligeiramente.

Adorei o texto,*__*

An disse...

Lembrei-me tanto de mim mesma nisso aqui que quase fiquei com medo. Quase.

Honey (L)